"Senhor, fazei-me instrumento de Vossa Paz"
São Francisco de Assis

terça-feira, 22 de julho de 2014

A paciência de Deus



Evangelho: Mt 13,24-43

A paciência de Deus

Em sua pregação aos camponeses da Palestina, na linguagem campestre deles, Jesus aborda hoje o tema da condenação (evangelho). Já vimos, no domingo passado, que ninguém conhece a profundeza do pensamento de Deus. Incredulidade não significa necessariamente perdição. Como ainda muitos "bons cristãos" hoje, também os antigos judeus se admiravam de que Deus deixasse coexistir fé e incredulidade, justos e injustos. Mas Deus não precisa prestar contas a ninguém. Sua grandeza, ele a mostra julgando com benignidade, pois ele tem suficiente poder; Deus não é escravo de sua própria força (Sb 12,18; 1ª leitura)! O salmo responsorial (Sl 86[85]), aparentado à revelação de Deus a Moisés em Ex 34,5-6, acentua o tema da magnanimidade de Deus.

Contrariando nossa impaciência e intolerância, Deus aguarda que talvez o injusto ainda se converta (12,19; cf. Lc 13,6-9). Sobre este tema Jesus bordou uma de suas mais eloqüentes parábolas: quando num campo se encontra joio no meio do trigo, é muito imprudente extirpar apressadamente o joio, pois se poderia arrancar também o trigo. Melhor é ter paciência, deixar tudo amadurecer e, no fim, conservar o que serve e queimar a cizânia. Deus é tão grande, que no seu Reino tem espaço até para a paciência com os incrédulos e injustos. Ele é quem julga.

A essa parábola são encadeadas algumas outras, de semelhante inspiração campestre (Mt 13,31-33), bem como uma consideração sobre a "pedagogia" das parábolas. Depois, Jesus explica a parábola do joio. As parábolas intermediárias (do grão de mostarda e do fermento) referem-se ao incrível crescimento do Reino de Deus. Há, porém, diferenças no acento. Na parábola do grão de mostarda, o enorme crescimento do Reino, incomparável com seu humilde início, dá uma impressão de amplidão, de expansão, de espaço; na parábola do fermento, é a força interior que é acentuada: um pouco de fermento dá gosto ao todo.

Nos v. 34-35, o evangelista faz uma observação sobre a pedagogia de Jesus. Ele não fala por meio de parábolas para confundir o povo, mas sua pregação confunde, de fato, os que acham que sabem tudo (cf. Mt 13,12-15; dom. pass.). Ora, para quem quiser escutar, cumpre-se, nesta pedagogia de Jesus, o que o salmista já anunciara há muito tempo: a revelação das coisas escondidas desde a formação do mundo.

O tema principal para hoje é, pois, a grandeza de Deus, que tem lugar para todos, inclusive os pecadores, até o momento em que eles terão de decidir se aceitam a sua graça, sim ou não. Isso nos ensina também algo sobre o pecado: com o tempo, o pecado se transforma, ou em arrependimento, ou em orgulho "infernal", ao qual cabe o destino que finalmente é dado ao joio.

E como viver num mundo onde coexistem fé e incredulidade, justiça e pecado (muitas vezes, dentro da mesma pessoa, dentro da Igreja também)? Como aceitar pessoas, sem aceitar seu pecado nem a estrutura pecaminosa de nosso mundo? São perguntas candentes, que podem ser meditadas à luz da paciência, não tanto "histórica", mas antes escatológica, de Deus.

A 2ª leitura nos ensina algo fundamental sobre a "espiritualidade". Para muita gente, espiritualidade é uma espécie de conquista de si mesmo, um treinamento, uma ascese -- tanto que, antigamente, "ascese e espiritualidade" eram estudadas no mesmo tratado. Ora, espiritualidade cristã existe quando o Espírito do Cristo vive em nós, toma conta de nós. Isso nada tem a ver com ascetismo, uma vez que o Espírito adota até a nossa fraqueza. Nós nem sabemos rezar como convém, mas "o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis" (Rm 8,26). Portanto, o importante é deixar-se envolver por esse Espírito e não expulsá-lo pela auto-suficiência de nosso próprio espírito. O Espírito do Cristo é que consegue dar conta da nossa fraqueza; o nosso, dificilmente...

Do livro "Liturgia Dominical", de Johan Konings, SJ, Editora Vozes


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