"Senhor, fazei-me instrumento de Vossa Paz"
São Francisco de Assis

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Somos todos Guadalupe





Por Pe. Hermes A. Fernandes e Karina Moreti

Neste dia 12 de dezembro, comemoramos a festa mariana de Nossa Senhora de Guadalupe. Das ermidas às catedrais, a Virgem com traços indígenas é lembrada como Mãe e Senhora. Mais que uma devoção mariana, Guadalupe se nos revela o rosto materno de Deus que se manifesta aos pequenos e empobrecidos.
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Assim como no século XVI, o México hoje é lugar de preocupantes desafios missionários. Não se pode negar o quanto aquele povo foi e é afetado pela exclusão e desigualdade social. Não são raras as notícias de mortes violentas, desconstrução dos ideais de defesa e promoção dos Direitos fundamentais que afligem lancinantemente o povo mexicano.
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Neste país, podemos ver as ruínas do antigo coração do império maia (Chichen Itza) ou Mexica (Tenochtitlan), as reservas da biosfera tão relevantes e o Santuário da Borboleta Monarca. Também possui uma longa história e tradição, com uma ampla diversidade cultural e uma densidade populacional que o torna um dos dez países mais densamente povoados do mundo. A superpopulação também superlativiza a pobreza. O sucateamento da saúde e da educação, tornando-as acessíveis aos mais abastados, excluindo os empobrecidos. Segurança pública é um “ser” mítico e utópico. Inexistente, na realidade. Em consequência, atrelada a isso, a insegurança é um dos problemas mais conhecidos no país, sendo considerada a principal causa de preocupação para os habitantes do México, tendo algumas cidades consideradas as mais perigosas no mundo. A principal razão para isso é o crime organizado. Especialmente, o tráfico de drogas. Ainda mais: apesar de desfrutar de uma ampla variedade cultural, várias organizações observaram que há um nível muito baixo de inclusão social em relação às minorias étnicas, sobremaneira, os descendentes de povos indígenas.
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Não se pode negar: depois de mais de 4 séculos, a desigualdade social, o desrespeito aos Direitos Fundamentais, a plutocracia e marginalização dos indígenas não se faz diferente. O tempo passou, mas não as dores. Chora-se o mesmo pranto.
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Voltemos a 1531. Estava o índio Juan Diego no campo. Ele sofria por causa da grave enfermidade de seu tio a quem muito amava. Juan rezava por seu tio quando teve a visão de uma mulher com seu manto todo reluzente. A Senhora pediu que o índio fosse revelar sua mensagem ao Bispo local e lhe pedisse que naquele lugar fosse construído um santuário para a honra e glória de Deus. Ela o chamou por seu nome e disse em nauátle, a língua asteca: Juan Diego, não deixe o seu coração perturbado.

O bispo, em pretensa prudência põe o indígena à prova. O sinal comprobatório se dá sobre a referida doença do tio de Juan Diego. Isso ocorreu quando Juan Diego buscava um sacerdote para o tio doente: “Escute, meu filho, não há nada que temer, não fique preocupado nem assustado; não tema esta doença, nem outro qualquer dissabor ou aflição. Não estou eu aqui, a seu lado? Eu sou a sua Mãe dadivosa. Acaso não o escolhi para mim e o tomei aos meus cuidados? Que deseja mais do que isto? Não permita que nada o aflija e o perturbe. Quanto à doença do seu tio, ela não é mortal. Eu lhe peço, acredite agora mesmo, porque ele já está curado. Filho querido, essas rosas são o sinal que você vai levar ao Bispo. Diga-lhe em meu nome que, nessas rosas, ele verá minha vontade e a cumprirá. Você é meu embaixador e merece a minha confiança. Quando chegar diante dele, desdobre a sua “tilma” (manto) e mostre-lhe o que carrega, porém, só em sua presença. Diga-lhe tudo o que viu e ouviu, nada omita…”
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O prelado viu não somente as rosas, mas o milagre da imagem de Nossa Senhora de Guadalupe, pintada prodigiosamente no manto do humilde indígena. Ele levou o manto com a imagem da Santíssima Virgem para a capela, e ali, em meio às lágrimas, pediu perdão a Nossa Senhora. Era o dia 12 de dezembro de 1531.

Uma linda confirmação deu-se quando Juan Diego fora visitar o seu tio, que sadio narrou: “Eu também a vi. Ela veio a esta casa e falou a mim. Disse-me também que desejava a construção de um templo na colina de Tepeyac e que sua imagem seria chamada de ‘Santa Maria de Guadalupe’, embora não tenha explicado o porquê”. Diante de tudo isso muitos se converteram e o santuário foi construído.
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O grande milagre de Nossa Senhora de Guadalupe é a sua própria imagem. O tecido, feito de cacto, não dura mais de 20 anos e este já existe há mais de quatro séculos e meio. Durante 16 anos, a tela esteve totalmente desprotegida, sendo que a imagem nunca foi retocada e até hoje os peritos em pintura e química não encontraram na tela nenhum sinal de corrupção.
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No ano de 1971, alguns peritos inadvertidamente deixaram cair ácido nítrico sobre toda a pintura. E nem a força de um ácido tão corrosivo estragou ou manchou a imagem. Com a invenção e ampliação da fotografia descobriu-se que, assim como a figura das pessoas com as quais falamos se reflete em nossos olhos, da mesma forma a figura de Juan Diego, do referido bispo e do intérprete se refletiu e ficou gravada nos olhos do quadro de Nossa Senhora. Cientistas americanos chegaram à conclusão de que estas três figuras estampadas nos olhos de Nossa Senhora não são pintura, mas imagens gravadas nos olhos de uma pessoa viva.

Declarou o Papa Bento XIV, em 1754: “Nela tudo é milagroso: uma Imagem que provém de flores colhidas num terreno totalmente estéril, no qual só podem crescer espinheiros… uma Imagem estampada numa tela tão rala que através dela pode se enxergar o povo e a nave da Igreja… Deus não agiu assim com nenhuma outra nação”.

No dia 27 de janeiro de 1979, durante sua viagem apostólica ao México, o Papa São João Paulo II visitou o Santuário de Nossa Senhora de Guadalupe e consagrou à Mãe Santíssima toda a América Latina, da qual a Virgem de Guadalupe é Padroeira.

Quão admiráveis são estas narrativas. Estilos hagiográficos à parte, podemos estar certos de que na história desta devoção, há muito da relação entre Deus e os homens. Não há dor, traduzida em pranto, que fique sem o acalento dos céus. Maria, na figura de Nossa Senhora de Guadalupe, é a maternidade de Deus que acalenta seus filhos. Sua presença entre os indígenas, traduz a certeza de que somos todos humanos e nesta humanidade se encerra a dignidade. Não em origens étnicas. A cura do tio de Juan Diego, mais que um fenômeno da taumaturgia, é o sinal de que Deus caminha conosco. Maria, aqui instrumento dele, acalenta e se faz sinal de esperança.
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Não vivemos tempos diferentes de Juan Diego. Também caminhamos aflitos, acabrunhados por nossas dores. Incertezas são muitas. Queira Deus se fazer presente, sendo-nos alento. Que a Virgem de Guadalupe ouça nossos prantos e os apresente ao Pai. Aquela que muito amou Jesus, seu Filho; também nos ama. Que venha até nós suas rosas. 

Guadalupe somos todos nós!


FONTE: https://eclesialidade.wordpress.com/



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